Por Gilvânia Banker - Jornal do Comércio/RS
A nova demanda determinada pelo fisco, como a geração de dados
digitais das duas contribuições federais, o PIS e a Cofins, ainda gera
dúvidas e inseguranças por parte de empresários e contadores. O técnico
em contabilidade, coordenador da Comissão de Estudos de Tecnologia da
Informação do Conselho Regional de Contabilidade (CRC/RS), Ricardo
Kerkhoff, entende que a principal dificuldade com relação a esses novos
modelos de informação é puramente conceitual. “É uma mudança de
paradigma que se constituiu durante muitas décadas, em que o empresário
realizava as operações de sua empresa sem a menor preocupação com a
legislação em vigor”, comenta o especialista.
O Sped Fiscal é um arquivo digital que contém um conjunto de
escriturações de documentos fiscais com informações importantes para o
fisco que deverá substituir outros controles. O Sped Contábil é a
substituição da escrituração em papel pela Escrituração Contábil
Digital.
Nos últimos tempos, de acordo com Kerkhoff, em virtude dos novos
modelos de fiscalização associados ao avanço tecnológico, as ações são
cada vez mais monitoradas, planejadas, avaliadas e previstas. Ele
observa que a falta de proatividade dos profissionais da contabilidade
acaba prejudicando o seu próprio trabalho. “Nossa atuação precisa estar
cada vez mais dentro da empresa, se fazendo presente em cada nota fiscal
emitida, em cada produto novo cadastrado, em cada mudança de legislação
ocorrida”, recomenda. Para ele, as novas demandas por parte do fisco
estabelecem uma espécie de “divisor de águas” sobre o passado e o futuro
das relações entre empresários e profissionais contábeis.
Para o advogado tributarista, sócio do Cabanellos Schuh Advogados,
Rafael Nichele, as empresas ainda têm dificuldade de lidar com os Speds,
pois esses sistemas representam uma novidade para a maioria dos
contribuintes. Segundo ele, as instituições têm procurado investir em
acompanhamentos especializados para o preenchimento das obrigações
acessórias e, principalmente, a interpretação da legislação tributária
antecipando-se a eventuais divergências com o fisco.
“As empresas estão inseguras”, diz o advogado. Ele acredita que os
problemas poderão se iniciar, num segundo momento, quando a Receita
Federal do Brasil começar a revisar os arquivos dentro do prazo de cinco
anos conforme estipula a legislação. “Neste período, as instituições
vão saber, efetivamente, mediante o recebimento de autos de infração, se
as informações por elas transmitidas estavam incorretas”, salienta.
Mas, para que não haja surpresas futuras, Nichele recomenda que os
gestores busquem se especializar para que as informações prestadas sejam
corretas e não gere autuações ou multas milionárias.
As dificuldades, conforme Nichele, também passam pela complexidade
tributária. A legislação do PIS/Cofins não cumulativo, por exemplo, já
sofreu mais de 80 alterações nos últimos meses. “É praticamente
impossível os empresários acompanharem tantas alterações”.
Pesquisa demonstra insatisfação dos empresários
A Fiscosoft, empresa especializada em informações fiscais e legais,
realizou um estudo com 1.188 empresas brasileiras e demonstrou que
96,3% dos pesquisados necessitam aplicar mais recursos, tais como horas
de profissionais, sistemas, consultoria externa, para cumprir com as
obrigações tributárias exigidas pelo fisco com o Sped.
Um dos objetivos dos Speds é a economia com a racionalização e
simplificação das obrigações acessórias. No entanto, 59,7% afirmaram que
essa redução não ocorrerá, pois não acreditam que, no futuro, será
possível cumprir as obrigações acessórias com menos recursos. Ou seja,
mesmo que haja uma fase de transição, a maioria entende que o sistema
continuará consumindo mais recursos.
Porém, com relação a melhorias na gestão e controles internos,
79,3% dos entrevistados afirmaram que o Sped trouxe, de fato, benefícios
para as empresas. A diminuição da concorrência desleal é também uma das
promessas do Sped, e 75,1% dos entrevistados acreditam que isso
acontecerá em decorrência da transparência e maior facilidade na
fiscalização por parte do fisco, evitando assim sonegação fiscal.
Apesar disso, o estudo também concluiu que, apesar do aumento de
custos, o Sped é positivo para o País, com mais de 90% das respostas.
Altos custos e aperfeiçoamento são necessários no processo
Além da complexidade do Sped, há um custo agregado que depende do
volume gerado. Para os estabelecimentos que possuem poucas informações é
mais simples e, portanto, o investimento também é menor. Segundo o
coordenador da Comissão de Estudos de Tecnologia da Informação CRC/RS,
Ricardo Kerkhoff, alguns casos são resolvidos com um custo de
aproximadamente R$ 3 mil ou R$ 4 mil. No entanto, em empreendimentos com
maior volume de informações e, naturalmente mais complexos, os
investimentos se iniciam com a capacitação e treinamento de pessoas,
passando por atualização de parque tecnológico e, por vezes, mudança de
sistemas. O cálculo, nesses casos, pode chegar até R$ 200 mil.
Os empresários, no entanto, são os principais responsáveis pela
geração e entrega das informações, pois eles precisam assinar
digitalmente ou passar uma procuração para o profissional da
contabilidade. Portanto, Kerkhoff observa a necessidade de
aperfeiçoamento de todos os envolvidos no processo.
Erros e divergências são comuns na transmissão dos dados
Outra pesquisa realizada em 2012 pela Prosoft Inteligência Contábil
e Proximidade mostrou que 98% dos dados enviados pelo Sped à Receita
Federal do Brasil (RFB) não seguiram as regras da entidade, causando
erros ou divergências de informações. A constatação faz parte de
levantamento feito pela área fiscal da empresa entre seus clientes.
De acordo com o diretor de análise tributária da Prosoft, Igor
Garrido, as instituições estão enviando as informações para a Receita
sem observar as divergências de números ao longo de todo o processo.
Além disso, além do acréscimo de detalhes exigidos no Sped, os gestores
precisam enviar as informações também via Fcont, sistema que será
substituído pelo digital.
Para Garrido, é necessário uma maior conscientização dos
empresários e contadores para entenderem que a contabilidade mudou e a
integração desse profissional com a empresa deve ser cada vez maior.
“Somente quando a Receita começar as autuações a consciência fiscal
aumentará”, diz o diretor.
A apuração do PIS e da Cofins para as empresas do lucro presumido
foi entregue em abril. No final de junho será a vez daquelas enquadradas
no lucro real. Garrido aconselha que os empresários invistam em um bom
software que traduza os dados e em qualificação de pessoal.
De acordo com dados da Prosoft, o volume de dados fiscais e
operacionais enviados por cada empresa em ambiente eletrônico para a
Receita aumentou 23 vezes, desde a implementação gradual do Sistema
Público de Escrituração Digital, ao longo dos últimos cinco anos. As
despesas com computadores, sistemas e, principalmente, mão de obra só
têm aumentado, segundo apontam as pesquisas.
O contador lançava manualmente o total das notas escrituradas.
Hoje, ele importa os dados, em ambiente eletrônico, de cada produto
comprado ou vendido pela empresa e a sua respectiva tributação (ICMS,
IPI, PIS, Cofins). “O resultado é que a base de dados enviada à Receita
passou de um gigabyte para 23 gigabytes”, afirma o diretor Garrido.
Quando digitalizados, os dados podem ser acessados pelo fisco
federal e também estadual, portanto, quanto maior o número de
informações enviadas em ambientes eletrônico, mais potente deverá ser o
servidor.
De acordo com o sócio do Tax Technology Group (TTG) da KPMG, Marlon
Custódio, o processo exigido pela Receita Federal do Brasil (RFB)
permite avaliar as movimentações de saída das notas fiscais que não
foram tributadas e identificar possível sonegação fiscal.
Já para as entradas referentes aos créditos serão avaliadas as
operações entre estabelecimentos, ou seja, serão realizados cruzamentos
com as NF-e que se encontram no site de dados da RFB. “O maior cuidado
que as empresas devem ter diz respeito à linha do tempo referente à
tomada de créditos e apuração dos débitos, ou seja, a RFB poderá
analisar as operações graficamente identificando possíveis oscilações
significantes”, comenta.